Criada em 1999, no Recife (PE), durante a realização do Fórum Paralelo da Sociedade Civil à III Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas para o Combate à Desertificação (COP 3), a Articulação no Semi-Árido Brasileiro (ASA) se destaca hoje no cenário nacional e internacional pela capacidade de propor e implementar estratégias simples e eficientes que contribuem para a convivência das populações rurais com a diversidade ambiental da região.
Resultado da soma de experiências de diversas organizações que, há anos atuavam no Semi-Árido, a ASA nasceu em um contexto político de extrema importância: a reunião de especialistas de todo o mundo para discutir a desertificação. Sendo esse um fenômeno que afeta as regiões áridas, semi-áridas e subúmidas secas da Terra, a realização da COP 3 no Nordeste brasileiro ganhou um significado especial.
“O que nos surpreendeu foi o fato de que, mesmo a Conferência sendo realizada no Nordeste do Brasil, o semi-árido brasileiro não aparecia nas discussões. Então, nos mobilizamos [organizações que atuavam na região] para dar visibilidade ao Semi-Árido dentro do evento da ONU [com a apresentação da Declaração do Semi-Árido]. Com isso, podemos dizer que ASA é fruto da mobilização da sociedade civil para a realização da conferência paralela à COP 3”, recorda pastor Arnulfo Barbosa, diretor executivo da ONG Diaconia, uma das organizações fundadoras da Articulação. Porém, no momento em que a ASA surgiu, o debate sobre o combate à desertificação ainda não estava amadurecido entre as organizações que fundaram a rede. “Naquele momento, o próprio termo ‘desertificação’ era pouco utilizado [pelas organizações]. A consciência de que o trabalho que as entidades da ASA desenvolviam na região já era de combate à desertificação foi sendo adquirida ao longo do tempo”, explica Barbosa.
Se, por um lado, o conceito sobre uma prática já empregada foi paulatinamente sendo absorvido por algumas organizações da ASA, por outro, as ações efetivas não eram algo novo. “A ASA já nasce trazendo, na sua Carta de Princípios, a questão do combate à desertificação. E isso não foi só por causa do evento da ONU, que acontecia em Recife no momento em que a ASA foi criada. Mas, também, porque as organizações que fazem parte da Articulação vêm discutindo a questão do desenvolvimento sustentável durante anos. E para nós, combater a desertificação no semi-árido brasileiro é promover a agroecologia, é se contrapor ao agronegócio e à concentração de terra e de renda na região”, afirma Paulo Pedro – integrante da ASA e representante nacional da sociedade civil no Programa de Ação Nacional de Combate à Desertificação, do Ministério do Meio ambiente. Assim, as ações e propostas políticas da ASA para a região fazem com que a própria existência da rede seja considerada uma estratégia de combate à desertificação.
Propostas - As estratégias da ASA para o desenvolvimento de ações efetivas de convivência com o Semi-Árido são baseadas em dois princípios: (i) a conservação, o uso sustentável e a recomposição ambiental dos recursos naturais e, (ii) a quebra do monopólio de acesso à terra, à água e a outros meios de produção.
Esses princípios orientam o desenvolvimento de várias medidas, tais como: incentivo e apoio ao desenvolvimento da agricultura familiar com base na agroecologia, captação e armazenamento de água de chuva para o consumo humano e para a produção de alimentos, entre outras. Além de promoverem uma melhor qualidade de vida no campo, essas medidas proporcionam a preservação dos recursos naturais e, conseqüentemente, a prevenção e a desaceleração do processo de desertificação no nosso País.
Para Conceição Marques, coordenadora executiva da ASA pelo Estado do Maranhão, um exemplo disso é o Programa Um Milhão de Cisternas (P1MC). “Nós não somos apenas um projeto de construção de cisternas. Nós temos todo um trabalho de mobilização e de capacitação que leva à convivência com a seca. Essa convivência passa por algumas práticas de manejo dos recursos naturais. Em vez do plantio tradicional do roçado, nós incentivamos o agricultor familiar a adotar novas práticas de manejo do solo e da água que preservam a caatinga. E quem abarca tudo isso é o P1MC”, explica.
Além disso, em 2003, foi criado no âmbito da Articulação o Grupo de Trabalho de Combate à Desertificação (GTCD). De acordo com Rodrigo Vaz, coordenador do Programa de Combate à Desertificação do Instituto Sertão e integrante do GTCD, o Grupo se reúne periodicamente para propor ao governo federal políticas públicas que promovam a convivência com o Semi-Árido. “O GTCD participou ativamente da formatação do Plano de Ação Nacional de Combate à Desertificação (PAN), lançado em 2004”, explica Vaz. A influência direta da Articulação na elaboração desse documento é um exemplo do reconhecimento público do governo de que a ASA se constitui como um fórum de maior importância para a região.
Segundo Sílvio Santana, diretor da Fundação Grupo Esquel Brasil e integrante do GTCD, a ASA conquistou esse respaldo devido ao acúmulo de experiências adquiridas ao longo dos anos e, com o quadro de mudanças climáticas anunciadas pelos cientistas nos últimos meses, o trabalho da Articulação está sendo reconhecido como fundamental para a preservação da vida no Semi-Árido. “Eu acho que o cenário que a gente tem, onde esses fenômenos das secas e das outras dificuldades, como a falta de acesso à água, o calor e etc. Tudo isso, de certa maneira, já é de domínio das propostas da ASA. Então, eu acredito que a gente tem a oportunidade de reafirmar, com muito mais força, as propostas que a gente tem feito. É como se nós tivéssemos na mão a chave para a solução desse problema”, explica.
Fórum Paralelo da Sociedade Civil à COP 3 – O evento foi realizado entre os dias 15 e 26 de novembro de 1999, no Recife, durante a realização da Terceira Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas de Combate à Desertificação. O Fórum reuniu, aproximadamente, 120 organizações da sociedade civil com atuação no Semi-Árido. Os participantes do evento elaboraram a Declaração do Semi-Árido, documento entregue aos representantes brasileiros no encontro da ONU.
segunda-feira, 31 de dezembro de 2007
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